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30 de out. de 2008

O valor de um NÃO


Rosângela Rocha Ventura


"O que pode criar um monstro?
O que leva um rapaz de 22 anos a estragar a própria vida e a vida de
outras duas jovens por nada?
Será que é índole? Talvez, a mídia? A influência da televisão? A
Situação social da violência? Traumas? Raiva contida? Deficiência
social ou mental? Permissividade da sociedade? O que faz alguém achar
que pode comprar armas de fogo, entrar na casa de uma família, fazer
reféns, assustar e desalojar vizinhos, ocupar a polícia por mais de
100 horas e atirar em duas pessoas inocentes?
O rapaz deu a resposta: "ela não quis falar comigo".
A garota disse: não, não quero mais falar com você. E o garoto,
dizendo que ama, não aceitou um não. Seu desejo era mais importante.
Não quero ser mais um desses psicólogos de araque que infestam os
programas vespertinos de televisão, que explicam tudo de maneira muito
simplista e falam descontextualizadamente sobre a vida dos outros sem
serem chamados. Mas ontem, enquanto não conseguia dormir pensando
nesse absurdo todo, pensei que o não da menina Eloá foi o único.
Faltaram muitos outros nãos nessa história toda.
Faltou um pai e uma mãe dizerem que a filha de 12 anos NÃO podia
namorar um rapaz de 19. Faltou uma outra mãe dizer que NÃO iria
sucumbir ao medo e ir lá tirar o filho do tal apartamento a puxões de
orelha. Faltou outros pais dizerem que NÃO iriam atender ao pedido de
um policial maluco de deixar a filha voltar para o cativeiro de onde,
com sorte, já tinha escapado com vida. Faltou a polícia dizer NÃO ao
próprio planejamento errôneo de mandar a garota de volta pra lá.
Faltou o governo dizer NÃO ao sensacionalismo da imprensa em torno do
caso, que permitiu que o tal seqüestrador conversasse e chorasse
compulsivamente em todos os programas de TV que o procuraram.
Simples assim. NÃO. Pelo jeito, a única que disse não nessa história
foi punida com uma bala na cabeça.
O mundo está carente de nãos. Vejo que cada vez mais os pais e
professores morrem de medo de dizer não às crianças. Mulheres ainda
têm medo de dizer não aos maridos (e alguns maridos temem dizer não às
esposas). Pessoas têm medo de dizer não aos amigos. Noras que não
conseguem dizer não às sogras, chefes que não dizem não aos
subordinados, gente que não consegue dizer não aos próprios desejos. E
assim são criados alguns monstros. Talvez alguns não cheguem a
seqüestrar pessoas. Mas têm pequenos surtos quando escutam um não,
seja do guarda de trânsito, do chefe, do professor, da namorada, do
gerente do banco. Essas pessoas acabam crendo que abusar é normal. E é
legal.
Os pais dizem, "não posso traumatizar meu filho". E não é raro eu
ver alguns tomando tapas de bebês com 1 ou 2 anos. Outros gastam o que não
têm em brinquedos todos os dias e festas de aniversário faraônicas
para suas crias. Sem falar nos adolescentes. Hoje em dia, é difícil
ouvir alguém dizer: "Não, você não pode bater no seu amiguinho. Não, você não vai assistir a uma novela feita para adultos. Não, você não vai fumar maconha
enquanto for contra a lei. Não, você não vai passar a madrugada na
rua. Não, você não vai dirigir sem carteira de habilitação. Não, você
não vai beber uma cervejinha enquanto não fizer 18 anos. Não, essas
pessoas não são companhias pra você. Não, hoje você não vai ganhar
brinquedo ou comer salgadinho e chocolate. Não, aqui não é lugar para
você ficar. Não, você não vai faltar na Escola sem estar doente. Não,
essa conversa não é pra você se meter. Não, com isto você não vai
brincar. Não, hoje você está de castigo e não vai brincar no parque".
Crianças e adolescentes que crescem sem ouvir bons, justos e firmes
NÃOS crescem sem saber que o mundo não é só deles. E aí, no primeiro
não que a vida dá (e a vida dá muitos), surtam. Usam drogas. Compram
armas. Transam sem camisinha. Batem em professores. Furam o pneu do
carro do chefe. Chutam mendigos e prostitutas na rua. E daí por
diante.
Não estou defendendo a volta da educação rígida e sem diálogo, pelo
contrário. Acredito piamente que crianças e adolescentes tratados com
um amor real, sem culpa, tranqüilo e livre, conseguem perfeitamente
entender uma sanção do pai ou da mãe, um tapa, um castigo, um não.
Intuem que o amor dos adultos pelas crianças não é só prazer – é
também responsabilidade. E quem ouve uns nãos de vez em quando também
aprende a dizê-los quando é preciso. Acaba aprendendo que é importante
dizer não a algumas pessoas que tentam abusar de nós de diversas
maneiras, com respeito e firmeza, mesmo que sejam pessoas que nos
amem. O não protege, ensina e prepara.
Por mais que seja difícil, eu tento dizer não aos seres humanos que
cruzam o meu caminho quando acredito que é hora e tento respeitar
também os nãos que recebo. Nem sempre consigo, mas tento. Acredito que
é aí que está a verdadeira prova de amor. E é também aí que está a
solução para a violência cada vez mais desmedida e absurda dos nossos
dias."

Cazuza deveria ser idolatrado?


Uma psicóloga que assistiu ao filme Cazuza escreveu o seguinte texto:

"Fui ver o filme Cazuza, há algum tempo atrás, e me deparei com uma coisa estarrecedora. As pessoas estão cultivando ídolos errados.
Como podemos cultivar um ídolo como Cazuza? Concordo que suas letras são muito tocantes, mas reverenciar um marginal como ele, é, no mínimo, inadmissível.
Marginal, sim, pois Cazuza foi uma pessoa que viveu à margem da sociedade, pelo menos uma sociedade que tentamos construir (ao menos eu) com conceitos de certo e errado. No filme, vi um rapaz mimado, filhinho de papai, que nunca precisou trabalhar para conseguir nada, já que tinha tudo nas mãos. A mãe vivia para satisfazer as suas vontades e loucuras. O pai preferiu se afastar das suas responsabilidades e deixou a vida correr solta.
São esses pais que devemos ter como exemplo?
Cazuza só começou a gravar porque o pai era diretor de uma grande gravadora.
Existem vários talentos que não são revelados por falta de oportunidade ou por não terem algum conhecido importante.
Cazuza era um traficante, como sua mãe revela no livro, admitiu que ele trouxe drogas da Inglaterra, um verdadeiro criminoso. Concordo com o juiz Siro Darlan quando ele diz que a única diferença entre Cazuza e Fernandinho Beira-Mar é que um nasceu na zona sul e outro não.
Fiquei horrorizada com o culto que fizeram a esse rapaz, principalmente por minha filha adolescente ter visto o filme. Precisei conversar muito para que ela não começasse a pensar que usar drogas, participar de bacanais, beber até cair e outras coisas, fossem certas, já que foi isso que o filme mostrou.
Por que não são feitos filmes de pessoas realmente importantes que tenham algo de bom para essa juventude já tão transviada? Será que ser correto não dá Ibope, não rende bilheteria?
Como ensina o comercial da Fiat, precisamos rever nossos conceitos, só assim teremos um mundo melhor..
Devo lembrar aos pais que a morte de Cazuza foi consequência da educação errônea a que foi submetido.
Será que Cazuza teria morrido do mesmo jeito se tivesse tido pais que dissesem NÃO quando necessário?
Lembrem-se, dizer NÃO é a prova mais difícil de amor.
Não deixem seus filhos à revelia para que não precisem se arrepender mais tarde. A principal função dos pais é educar... Não se preocupem em ser 'amigo' de seus filhos. Eduque-os e mais tarde eles verão que você foi à pessoa que mais os amou e foi, é, e sempre será, o seu melhor amigo, pois amigo não diz SIM sempre."


Karla Christine
Psicóloga Clínica

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